Slide da educação do Paraná chama vítimas da ditadura de "antipatriotas" e "esquerdistas" APP-Sindicato

Slide da educação do Paraná chama vítimas da ditadura de “antipatriotas” e “esquerdistas”

Material veiculado pela Secretaria da Educação expõe doutrinação bolsonarista imposta à escola pública

Investigar, perseguir, torturar e matar. Assim funcionava a Operação Condor, um acordo mortífero estabelecido na década de 1970 entre ditaduras militares de países da América do Sul, para eliminar pessoas que não concordavam com o regime autoritário.

Mas segundo um slide disponibilizado pela Secretaria da Educação do Paraná (Seed) para professores(as) repassarem o conteúdo aos(às) estudantes, as vítimas dos horrores da ditadura seriam “antipatriotas” e “esquerdistas’.

Na foto da tela recebida pela APP, é possível verificar múltiplos usuários visualizando a apresentação

Secretária Educacional da APP-Sindicato, Vanda Santana classifica a situação como gravíssima, pois nota que o texto reproduz o posicionamento político ideológico de quem elaborou um material que é disponibilizado para todos os(as) professores(as) da rede estadual.

A dirigente critica o modelo adotado pela educação paranaense para a produção de materiais didáticos, pois o método possibilita que a opinião de um indivíduo vire referência no ensino. “Por isso nós temos reforçado constantemente a importância da autonomia no trabalho docente, desde o seu planejamento, produção de material e o encaminhamento das aulas”, comenta. 

Vanda enfatiza que a APP defende o conhecimento científico que passou por processo de pesquisa e validação das universidades e diversos pesquisadores(as). “Portanto, não podemos aceitar esse negacionismo e revisionismo histórico que esse tipo de slide apresenta”, argumenta.

A denúncia do material circulou em grupos de mensagem na última sexta-feira (1º). Horas depois, o conteúdo foi alterado. Na nova redação, os alvos da ditadura são retratados como “opositores e pessoas consideradas subversivas à ordem estabelecida”. 

Para a docente, a modificação do texto continua problemática, pois mantém o viés ideológico de defesa de um Estado governado por regimes autoritários, sem democracia, e de criminalizar qualquer espectro político diferente dos partidos conservadores.

Não é a primeira vez

Não se trata de um caso isolado ou a primeira ocorrência. Em fevereiro deste ano, a APP denunciou outro material ofertado pela Seed com enfoque inadequado. O conteúdo distribuído para as aulas de Educação Financeira trazia slides estigmatizando a pobreza e culpabilizando estudantes pela sua condição social.

Para o professor aposentado, Luis Claudio Pereira, que lecionou a disciplina de História por mais de 32 anos nas redes pública e privada, o ocorrido é inaceitável e deixa evidente a ideologização bolsonarista que tomou conta da educação pública paranaense sob a gestão de Ratinho Jr. e Renato Feder.

“É assustador. O governo cria uma narrativa justificando um posicionamento ideológico da direita. Isso é nocivo para a democracia e nos afasta de uma visão de mundo pautada nos direitos humanos”, diz.

Regra de sangue

Com apoio dos Estados Unidos, a Operação Condor foi executada no Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Chile. Segundo historiadores, o nome seria inspirado na ave símbolo do Chile, o Condor, animal implacável na caça às suas presas e que se alimenta de carniça. Também seria uma referência à expressão “com dor”, remetendo aos métodos violentos utilizados pelo regime.

A lógica persecutória e de violência do plano é narrada pelo jornalista e autor do livro Operação Condor: Sequestro dos Uruguaios (L&PM, 2008), Luiz Cláudio Cunha. “A regra de sangue da Condor era identificar o inimigo, localizar, mandar o comando para pegar, sequestrar, torturar, extrair as informações, matar e desaparecer com o corpo”, relatou em entrevista ao jornal El País.

Golpe militar

O regime militar durou 21 anos no Brasil. A ditadura teve início após o golpe militar que depôs o então presidente João Goulart, em 31 de março de 1964. Além do autoritarismo e das violações aos direitos humanos, o período foi marcado por não ter eleições diretas para presidente(a), fechamento do Congresso Nacional e censura.

De acordo com o relatório final da Comissão Nacional da Verdade, as graves violações de direitos humanos praticadas pelo regime militar no Brasil resultaram em 434 mortos e desaparecidos políticos. Já um levantamento divulgado pela Human Rights Watch, aponta que 20 mil pessoas foram torturadas e 4.841 representantes eleitos(as) pelo povo destituídos(as).

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