A teimosia do governador Ratinho Jr em impor a volta às aulas presenciais já cobra a conta dos educadores(as) paranaenses. Uma professora de Campo Largo se infectou com o coronavírus na escola após o retorno presencial e contaminou os dois filhos e uma sobrinha. O mês de junho tem sido terrível para A.O.Z, 40, professora de Língua Portuguesa e de Cidadania e Civismo num colégio militarizado por Ratinho Jr. Depois de ser obrigada a retomar as aulas presenciais, ela adoeceu, teve que cuidar dos filhos doentes e ainda precisou lutar contra o Governo do Estado, que quis obrigá-la a voltar ao trabalho presencial durante o período de isolamento social obrigatório para quem está infectado pelo coronavírus. O carinho dos alunos, registrados em carta e mensagens no zap, tem sido o alento de A. nesses dias de dificuldades impostas por um governador desalmado. “Estão me escrevendo um monte de coisas lindas, porque o aluno sabe a importância que tem o professor, mas eu chego à conclusão que o Governo não não dá a devida importância pra gente”, anima-se.
A. está se recuperando, em casa. Com a fala ofegante, ela relata o drama que começou num malfadado 24 de maio, quando o Governo Ratinho Jr impôs a volta às aulas presenciais no colégio em que ela dá aulas a 500 alunos de 18 turmas. Ela frequentou o colégio diariamente até que, no meio da segunda semana, começou a sentir fortes dores no peito. “Retornamos com alunos do sexto ano. Inclusive num dos dias um aluno estava espirrando, mas ele falou que era rinite alérgica, que realmente ataca no frio, então não tínhamos como saber se era uma criança assintomática”, conta. Depois de ter um teste de farmácia para Covid negativado, A. piorou muito no domingo (6), acendendo o alerta para toda sua família. No mesmo dia, os dois filhos dela, de seis e 13 anos, começaram a ter febre alta.
“Meus filhos pegaram essa porcaria dessa doença que eu trouxe pra casa, que eu trouxe da escola, com certeza. Passei para eles e para minha sobrinha. Era eu que estava disseminando o vírus em casa. Há um ano eu não saía de casa. Só saí para ir à escola. Então eu trouxe de lá”, afirma A. . “O secretário da Educação tem uma bola de cristal e acha que ninguém pega Covid 19 na escola”, lamenta. Ela não tem informação sobre outros casos de Covid no colégio. “Uma colega estava com sintomas mas testou negativo na farmácia, como aconteceu comigo. Como me afastei, não tive mais informação”, diz. A escola continua aberta. “O Governo explicou que tem que ter três casos na escola para fechar e eles fazerem uma sanitarização”, conta.
Debilitada pela Covid, A. passou a ter que enfrentar o Governo Ratinho Jr para não voltar ao trabalho durante o período de isolamento obrigatório. A Perícia Médica insistia que ela retornasse ao trabalho presencial no dia 9 de junho, mas o pronto-socorro determinara isolamento até o dia 11. No dia 8 a professora foi ao Hospital do Rocio, onde foi informada de que deveria permanecer em isolamento social até dia 19. “A Perícia não aceitou, falaram que aquilo não era um atestado, porque estava escrito termo de isolamento. Eles disseram que eu poderia ficar até dia 11 e depois eu teria que retornar no dia 14”, relata a professora. A. teve que procurar outro médico, sendo obrigada a circular pela cidade quando deveria estar isolada. “A médica disse: você tem que ficar em repouso, você não pode retornar, é muito perigoso. Você não sabe o que está dentro do teu pulmão”, conta.
Inconformada com a arbitrariedade do Governo Ratinho Jr, A. fez uma denúncia ao Ministério Público. “Questionei se eu deveria voltar ao trabalho presencial, porque assinei um termo de isolamento social e não posso infringir a lei. Aí eles falaram: você não pode retornar com Covid de forma alguma”, lembra.
Ela se viu obrigada a contratar advogado para questionar a Perícia Médica do Governo do Estado. “No mesmo dia acataram até dia 21 o meu atestado. Fiz também uma reclamação na Ouvidoria da Perícia e da Secretaria da Saúde. Falaram que a recomendação da Sesa é que se a pessoa tiver Covid fraca, pode retornar ao trabalho. Mas será que eles sabem que a gente está dando aula presencial? Será que é justo retornar ao trabalho colocando meus alunos em risco? Será que os pais deles sabem disso?”, questiona.
Parece inacreditável que uma professora tenha que desafiar o Governo do Estado para não ser obrigada a contaminar alunos(as) e colegas. Isso explica boa tarde da dificuldade de conter a pandemia no Paraná. “Ficou nítido para mim que não estão nem aí se alguém com Covid for para a escola trabalhar e passar para os outros. Porque se eu fosse uma pessoa sem noção eu teria voltado, como eles mandaram, com Covid, passando para os alunos(as), passando para as pessoas que estão trabalhando lá na escola”, afirma A. . O negacionismo do governador Ratinho Jr empurra as pessoas para situações contraditórias que geram sofrimento. “Se eu descumprisse a lei do isolamento seria presa, mas eu estava seguindo uma norma do Estado. Que tipo de organização de governo é essa que faz a pessoa não seguir uma lei?” indaga.
A professora lamenta a covardia do Governo Ratinho Jr com os educadores(as), obrigados a voltar às escolas, enquanto outros(as) servidores(as) públicos estão dispensados(as) dos atendimentos presenciais. “A Secretaria da Educação não está funcionando presencialmente, a Perícia Médica não atende presencialmente, mas os professores(as) atendem presencialmente os aluno(as) sem vacina. Por que para nós é diferente?”, diz. “Não é justo isso,colocar as pessoas em risco desta forma e não dar o amparo para o descanso, para recuperação. Isso é desumano”, comenta.
A indignação da professora A. é ainda maior porque os educadores(as) da escola em que trabalha haviam decidido não retomar as aulas presenciais. Com isso, mais uma farsa do governador Ratinho Jr foi desmascarada, pois ele havia dito que as aulas só seriam retomadas presencialmente por decisão das comunidades escolares. “Nossa escola virou cívico-militar e parece que não tem mais os mesmos direitos das outras, porque nós escolhemos não retornar em votação numa reunião de professores. Decidimos não voltar antes da vacina, até porque a gente queria que fosse igual a todas as escolas do município”, lembra A. . Uma semana depois dessa votação, os professores foram convocados pela direção da escola para retomar as aulas presenciais.
A justificativa apresentada pela diretora foi que todas as escolas cívico-militares estavam retomando as aulas presenciais. “Nós questionamos que nossa escola é cívico-militar, mas nós somos professores estaduais como qualquer outro, de qualquer outra escola, que não retornou. Não adiantou”, conta A. . “Nossa escola nem recebeu o diretor militar até agora. Então que escola cívico-militar é essa que nem diretor militar tem? Mas mesmo assim a diretora disse que nós tínhamos que voltar”, completa. Ela conversou com vereadores e com o prefeito de Campo Largo para tentar impedir a insanidade de voltar às aulas em momento de descontrole da epidemia no município, mas não teve apoio.
Agora que está chegando o momento em que terá direito à vacina, A. terá que esperar mais 30 dias para tomar a primeira dose, prazo recomendado para quem já contraiu o coronavírus. Enquanto se recupera da situação em que foi envolvida pelo Governo Ratinho Jr, A. se nutre do carinho dos alunos(as), expresso em mensagens de amor. “Trabalhamos o gênero literário Carta e agora eles escreveram uma para mim. Fico muito feliz, pois isso mostra que o aprendizado é para a vida, não apenas para você ser um profissional. Isso mostra ao Governo que fazemos a diferença e precisamos ser respeitados”, afirma, citando o psiquiatra e professor Augusto Cury: “Professores brilhantes ensinam para uma profissão. Professores fascinantes ensinam para a vida.”