A Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) recebeu, nesta terça-feira (11), reitores, professores, estudantes e funcionários de universidades estaduais em uma audiência pública que lotou as 109 cadeiras do Plenarinho. A conversa buscou esclarecer as mudanças previstas pelo governador do estado, Beto Richa (PSDB), na administração das Instituições Estaduais de Ensino Superior (IEES).
A lotação do espaço tem justificativa: em suas falas, os participantes – tanto os que integraram a mesa principal quanto o público presente – denunciaram uma política de desmonte do ensino superior estadual por parte do governador do Paraná. Em consenso, a audiência apontou que a maior parte das medidas propostas por Richa comprometem a autonomia universitária, garantida pela Constituição de 1988 e reproduzida, inclusive, na legislação estadual.
Educação pública sob controle neoliberal
Para o reitor da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Mauro Luciano Baesso, as novas políticas são uma tentativa de implementar um controle político nas instituições públicas. Uma das medidas pretende migrar a gestão financeira das IEES para o sistema RH Meta4, que administra o serviço público no Paraná e submete as universidades à perda de soberania: caso aprovada, a proposta fará com que o financiamento de pesquisas e a produção de conhecimento estejam sujeitas a definições orçamentárias do Poder Executivo. “Nesse sistema, entidades e setores do governo é que vão decidir sobre as progressões internas. Uma sociedade livre não pode controlar o pensamento dos indivíduos”, ponderou Baesso na audiência.
Com a implementação do RH Meta4, que Beto Richa tenta validar desde 2013, estudos e projetos que não interessem ao governo estadual podem ser vetadas. A Universidade Estadual do Paraná (Unespar) e a Universidade Estadual do Norte do Paraná (Uenp) já foram inseridas no sistema e estão sujeitas à fiscalização do Estado, sem a plena gestão institucional assegurada na lei. De acordo com o professor Nilson Magagnin Filho, coordenador do Comitê em Defesa do Ensino Público do Paraná, essa medida representa um ataque frontal à estrutura universitária. “Mais uma vez, o governo estadual tenta submeter a folha de pagamento à burocracia institucional. As IEEs devem administrar suas próprias prioridades, conforme o contexto particular de cada uma, sem ingerência do poder público”, afirmou.
Para Filho, a educação deve ser uma política de Estado e não de governo, sujeita às oscilações da política. “Outras gestões já tentaram fazer isso e as universidades resistiram, como resistimos agora. E deixo um recado: as instituições não vão se dobrar a esse governo, como não se dobraram aos anteriores”, alertou o professor, que foi ovacionado pela audiência.
Dedicação Exclusiva
Também está sob ameaça o benefício concedido aos professores por meio do Tempo Integral de Dedicação Exclusiva (TIDE), garantido na Lei 14.825/2005 e enquadrado como regime de trabalho. A nova proposta do governo estadual é revê-lo e classificá-lo como gratificação de caráter temporário, o que, para os conselhos universitários, conduz à precarização do trabalho em regimes parciais de expediente. “Como um professor qualificado vai se interessar em prestar concurso para nossas instituições se esse profissional só vai ter garantia por um ano e no ano seguinte não saberá o que vai ocorrer?”, questionou
O regime de dedicação exclusiva é o que assegura às instituições a criação de projetos de pesquisa, extensão e pós-graduação. Com o TIDE, as universidades conseguem extrapolar o ambiente da sala de aula e construir iniciativas que sirvam à comunidade das regiões em que se inserem. Para o professor Wilson Zonin, que atua no campus Marechal Cândido Rondon, da Unioeste, as novas medidas afetam programas de pós-graduação e a qualidade do ensino. “O governo não tem compromisso com a educação, apenas com seus financiadores de campanha. O progresso das universidades – científico, intelectual, acadêmico – com autonomia e soberania garante o progresso do Paraná”, defendeu Zonin. Ele complementou que, hoje, mais de 300 programas de pós-graduação em todo estado vêm sendo conduzidos por professores de forma voluntária, sem qualquer gratificação extra.
Cortes no orçamento
Enquanto Richa difunde a ideia de que as universidades têm um custo muito alto, cresce cada vez mais o número de serviços pagos dentro das instituições públicas. A presidente do Diretório Central dos Estudantes da UEL, Anaeliza Rosisca, denunciou o valor de R$ 4,70 cobrado no restaurante universitário em Londrina – um dos mais caros do Brasil. “Recentemente, Richa anunciou que cada estudante custa ao Estado o valor de dez mil reais. Mas onde está esse dinheiro investido se precisamos pagar por inúmeros serviços, desde xerox até a impressão de documentos?”, questionou. Para ela, as afirmações do governo estadual sobre um suposto alto custo das instituições universitárias representam uma tentativa de pressionar pela aprovação do RH Meta4 e justificar os cortes orçamentários.
A diretora da União Paranaense dos Estudantes (UPE), Isabela Marin, destacou que o momento político do Brasil a nível nacional se reflete nas universidades estaduais, que precisam resistir contra a agenda neoliberal. “A ideia que se dissemina é a do Estado mínimo. A política do Meta4 vai fazer com que as instituições públicas fechem suas portas diante da falta de recursos do governo”, denunciou a estudante.
Fonte: Brasil de Fato