O mês de março é referência na luta das mulheres. Apesar de alguns avanços notáveis, em pleno século 21, a desigualdade permanece a pleno. São as mulheres que mais sofrem com a pobreza extrema, com o analfabetismo, com as falhas no sistema de saúde, com os conflitos e com a violência doméstica. E com a crescente redução de direitos e de políticas públicas adotada pelo Governo Federal como justificativa para o ajuste fiscal, o resultado é cruel: menos direitos e políticas sociais, mais pobreza e desigualdade, especialmente para as mulheres.
Além de elas serem maioria nas atividades precarizadas, de serem absurdamente afetadas pelo regime intermitente aprovado na reforma trabalhista e de acumularem as funções domésticas, outros indicadores vêm chamando a atenção. A proporção de mulheres que chefiam os domicílios aumentou de 24,8% para 43% nos últimos 20 anos. Mulheres negras possuem o menor rendimento em relação a homens brancos e negros e mulheres brancas, variando entre R$ 1.027,50 e R$ 2.509,70, segundo o levantamento do Ipea “Retrato das Desigualdades de Gênero e Raça”.
Nos últimos 10 anos, assistimos a intensificação das políticas sociais no Brasil, acompanhadas de medidas de valorização do salário mínimo que possibilitaram avanços importantes na agenda social, como a redução da pobreza e da fome, expressões históricas da desigualdade estrutural. Os números do Índice de Desenvolvimento Humano – IDH no nosso País, onde as mulheres representam 52% da população, podem demonstrar o quanto essa mudança aconteceu: passamos de 0,493, em 1991, para 0,727, em 2010, um crescimento de 47,8%. Nesse mesmo período, 36 milhões de pessoas foram retiradas da pobreza e o País, pela primeira vez, saiu do Mapa da Fome e da Miséria em 2014, sendo este um dos principais avanços considerados pela Organização das Nações Unidas.
Mesmo assim, a incidência da pobreza nos lares também variou em função do gênero. Se as famílias são comandadas por mulheres, as taxas de pobreza extrema atingem 9,6%, frente aos 7,1% quando o chefe da família é homem. Se analisarmos os números do Cadastro Único do Governo Federal, quanto mais baixa for a renda per capita da família, maiores são as chances de ser chefiada por mulheres.
Segundo estimativa do Banco Mundial, em 2017, o Brasil tinha cerca de 6 milhões de “novos pobres”, o que significa considerar 11,2% da população como pobres, frente aos 8,4% registrados em 2014. Das 26.946.898 famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais (76,5 milhões de pessoas), 12.547.592 têm renda per capita familiar de até R$ 85,00, ou seja, na faixa da extrema pobreza.
Mesmo com essa dura realidade, se compararmos junho de 2016 a junho de 2017, quase um milhão de famílias foram desligadas do Programa Bolsa Família, sem falar no Minha Casa Minha Vida, Programa de Aquisição de Alimentos e a Rede de Proteção às Mulheres Vítimas de Violência, que minguam a cada dia. A redução dos investimentos na política de assistência social, que chegou a 11% no Orçamento de 2018, aponta para cortes ainda mais drásticos na rede de proteção e no número de famílias atendidas.
O cenário será de aumento da pobreza, em especial a extrema pobreza, que afeta especialmente as mulheres, as mulheres negras, a infância e a juventude, com aprofundamento da desigualdade social, racial e de gênero no Brasil. O quadro ainda é mais dramático nos casos de alinhamento político da direita, como é no Rio Grande do Sul, governada por Sartori (PMDB), e na capital Porto Alegre, Marchezan (PSDB).
No Rio Grande do Sul, o governador Sartori também desmontou a política estadual de erradicação da extrema pobreza, o RS Mais Igual, que já atendeu 100 mil famílias gaúchas, sem colocar absolutamente nenhuma política pública como alternativa. Em Porto Alegre, a gestão Marchezan tem desvalorizado os trabalhadores e trabalhadoras da Assistência Social, desmontando a Rede de Atendimento e colocando a população mais pobre de volta às ruas, com mendicância e fome.
Um país que era exemplo mundial de inclusão, um Estado que sempre se orgulhou por ter baixos indicadores de pobreza em comparação com o restante da nação, e uma capital antes referência em democracia e inclusão passam a ser territórios de insensibilidade e truculência social. Uma passagem rápida do orgulho para a vergonha.
Como conter essa tendência de desmonte do sistema de proteção e dos direitos implantados nas últimas décadas e que deveriam ser consolidados? Quando vamos entender que combater à fome é, sim, empoderar as mulheres?
O caminho está na organização, na resistência e na luta pela democracia.
*Por Paola Loureiro Carvalho – Assistente Social, especialista em Gestão de Políticas Públicas.
Fonte: Sul 21