Governo de Ratinho Júnior encerra oferta de curso que transformou diarista em técnica de enfermagem

Governo de Ratinho Júnior encerra oferta de curso que transformou diarista em técnica de enfermagem

Decisão do governo impede principalmente que jovens e adultos das periferias tenham uma profissão, possam mudar de vida e provoca desemprego de professores(as)

Foto: Altvista/APP-Sindicato

Moradora da periferia sul de Londrina, no norte do Paraná, a ex-diarista, Valessa dos Santos Silva, de 43 anos, viu sua vida ser transformada após concluir, em dezembro do ano passado, o curso Técnico de Enfermagem oferecido gratuitamente na rede pública estadual. Ela passou em um concurso público e já foi convocada para assumir uma vaga de auxiliar de enfermagem na Prefeitura do município. Mas muitos(as) paranaenses não terão mais a mesma oportunidade da Valessa, porque a gestão do governador Ratinho Jr. (PSD) decidiu encerrar a oferta de vários cursos técnicos em todo o estado.

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“Para mim, esse curso foi uma virada de chave, pois eu, com 43 anos, não tinha profissão nem perspectiva quando voltei a estudar. Tive o incentivo e suporte de vários professores e me inscrevi em um concurso público que para mim era algo totalmente distante. Passei e hoje tenho uma profissão, serei funcionária pública”, explica a técnica de enfermagem.

Foto: Colégio Estadual Albino Feijó Sanches/ Google Street View

Embora a oferta dos cursos técnicos de nível médio seja uma política pública fundamental para garantir a profissionalização gratuita de jovens e adultos, propiciando uma chance de ter uma profissão e até de mudar de carreira, o governo Ratinho Jr tem priorizado números ao bem-estar social. 

Nos últimos dias a APP-Sindicato têm recebido várias denúncias de que a Secretaria da Educação (Seed) comunicou a decisão de encerramento da oferta desses cursos ofertados em vários estabelecimentos da rede estadual de ensino. O Colégio Estadual Albino Feijó Sanches, onde Valessa estudou, é um dos que está na lista. Ignorando o impacto social e econômico da política pública, o governo justifica a deliberação alegando baixa procura e permanência de estudantes e até suposta falta de professores(as).

Segundo a secretária Educacional da APP, Vanda Santana, além do Colégio Albino Feijó Sanches, cursos subsequentes do litoral e da região de Curitiba também estão com os dias contados. No Centro Estadual de Educação Profissional de Curitiba (CEEP), por exemplo, serão fechados os cursos de Mecânica, Eletromecânica, Edificações e Química.

Com o fechamento, centenas de estudantes perderão a oportunidade de conseguir uma formação de qualidade e gratuita, restando apenas a formação paga em redes particulares. No caso de um curso Técnico em Enfermagem ofertado em escolas privadas, a média de valor para a modalidade presencial chega a quase a metade de um salário mínimo por mês. No Senac, por exemplo, o valor total do curso custa R$ 13.509,00.

“O fechamento desses cursos impacta grandemente na formação, capacitação e desenvolvimento da população que, na sua maioria, são de pessoas que precisam de suporte social dos órgãos públicos. Tirar a possibilidade da população se profissionalizar é um retrocesso gigantesco, principalmente em um estado que é considerado um dos melhores na educação pública. Não tem nem fundamento o fechamento desses cursos”, completa Valessa.

Com o fechamento do curso no Colégio Albino Feijó Sanches, a comunidade escolar aponta que alunos(as) de baixa renda e de regiões rurais de Londrina, como as comunidades Lerroville e Tamarana, terão maior dificuldade para ascender profissionalmente e aproveitar as oportunidades de emprego na saúde e outras áreas que precisam de trabalhadores(as) com formação de nível técnico.

Professores(as) desempregados(as)

Assim como os(as) jovens que perderão a oportunidade de ter uma profissão, essa política de corte de políticas públicas preocupa os(as) professores(as) que lecionam nos cursos técnicos e têm essa atividade como fonte de renda.

É o caso da professora Almeir Evangelista Sanches, que dá aulas no curso Técnico de Enfermagem há 16 anos e chegou até a coordenar o curso. Mas agora, como é professora contratada pelo regime PSS e o anúncio do fechamento do curso na unidade, viu sua fonte de renda ameaçada.

“O Colégio Albino foi minha casa. Com o fechamento do curso, nós professores sofreremos um grande impacto, pois muitos temos só esse vínculo empregatício. Já os(as) estudantes perderam a chance de crescimento profissional e realizações de sonhos no qual, muitos desses conseguimos realizar”, explica a educadora.

Foto: da direita para a esquerda. Professora Almeir Sanches com uma turma do curso Técnico de Enfermagem. Arquivo Pessoal

Almeir enfatiza que, ao contrário do argumento da Seed, os cursos na unidade têm muita procura, com abertura anual de turmas. “Temos muita procura de abertura de turmas e com o fechamento, muitos alunos que estão aguardando a realização desse sonho serão afetados. Fora a tristeza dos colegas na escola, por tanto que conquistamos e simplesmente o Estado não quer mais fornecer o curso”, completa a enfermeira.

Mobilização

A secretária Educacional aponta que o Ratinho Jr promove uma política exclusionária, dificultando o acesso de pessoas de baixa renda a um projeto importante de profissionalização.

“A política do governo Ratinho, mais uma vez promove exclusão de jovens e adultos do acesso à formação técnica gratuita ao considerar apenas índices de frequência e de demanda do mercado.Também responsabiliza as escolas pela formação de turmas, desconsiderando que há toda uma questão social envolvida que exige dos governos um olhar diferenciado para o atendimento das juventudes”, explica Vanda Santana.

A dirigente reforça que as comunidades escolares devem se manter mobilizadas para barrar os retrocessos impostos pelo governador e que a APP-Sindicato continua cobrando da Seed para que os fechamentos sejam revertidos.

“É fundamental que a comunidade escolar se mantenha mobilizada em defesa da permanente oferta dos cursos técnicos. A APP-Sindicato continua cobrando que a Seed reconsidere sua posição por não autorizar a abertura de novas turmas, bem como orienta que estudantes, professores(as) e direções de escola encaminhe para o sindicato as denúncias”, finaliza a secretária.

Foto: Bruna Durigan

Subsequentes ameaçados

Não é de hoje que os cursos técnicos estão na mira do governador Ratinho Júnior. Em 2024, a Seed fechou o curso técnico de Segurança do Trabalho no Colégio Estadual Reinaldo Sass, de Francisco Beltrão. Na ocasião, estudantes foram às ruas exigir a continuidade do curso. 

O governo também realizou o fechamento de escolas em todo o estado. O Ministério Público identificou que a política gera evasão escolar; quando o(a) aluno(a) não efetua a matrícula para a continuidade dos estudos no ano seguinte.

No fim de 2023, estima-se que o governo encerrou cerca de 8 mil vagas de ensino noturno. O número considera as escolas que passaram por consulta para adesão ao modelo cívico-militar, onde o ensino noturno não é ofertado.

Na época, o Ministério Público do Paraná  interviu no fechamento de turmas do período noturno. Em agosto de 2023, a 3ª Promotoria de Justiça de Campo Largo, expediu uma recomendação administrativa para que as turmas sejam reabertas no Colégio Estadual Macedo Soares, de Campo Largo, a partir do ano letivo de 2024.

No documento assinado pelo promotor de Justiça Rodrigo Baptista Braziliano, a decisão da Seed foi classificada como indevida, retrocesso social e violação ao princípio da gestão democrática. Segundo a Promotoria, o Conselho Escolar não concordou com o fechamento das turmas e uma pesquisa realizada com os(as) estudantes apontou que 95,6% responderam que o Colégio Macedo oferece vantagens para o seu deslocamento.

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