A mensagem chegou no dia 17 de março, durante reunião do Conselho Estadual de Educação do Paraná (CEE-PR), o qual Maria das Graças Figueiredo Saad presidia. No cargo há dois anos, ela diz que não esperava o que se seguiu. O secretário estadual da Educação, Renato Feder, disse que precisava falar com ela urgente. “Passei a presidência para meu vice, saí e liguei para o secretário. Ele disse que tinha um assunto não muito agradável para me dizer”, conta Graça.
Ali, no meio da reunião, ela foi informada pelo secretário de que estava sendo substituída na presidência do Conselho de Educação. “Eu disse que eles têm este direito, só perguntei o motivo, mas ele não explicou, só disse que às vezes tínhamos alguns atritos.”
A Secretaria Estadual de Educação (Seed) diz que não irá se pronunciar sobre a troca na presidência do CEE. Ela pode, no entanto, ter sido apressada pelo ofício enviado pelo Conselho Pleno à pasta em 15 de março, dois dias antes da exoneração de Graça. Ele informava quais seriam as novas, e restritas, atribuições de regulação da pasta para 2021.
“Deliberamos para a secretaria para que eles fizessem alguma regulação. Como tínhamos muito trabalho, foi delegado para a Seed fazer algumas coisas. Depois pedimos de volta, pois tínhamos pedido alguns relatórios e eles não foram encaminhados. Então, o Conselho Pleno decidiu que nós trouxéssemos de volta toda esta regulação de escolas”, explica Graça.
A decisão, porém, não agradou Feder. “O secretário queria que a gente continuasse delegando estes poderes para a Secretaria. Eu fui lá, conversei com ele… mas sempre eles quiseram toda delegação, mas nós delegamos algumas coisas, não tudo. E ele queria a delegação de tudo. Expliquei que iríamos delegar o que já estava, além disso, nós não podemos.”
Segundo ela, esse foi um dos questionamentos, o da delegação. “Eles queriam tudo pra eles e nós não demos este poder para que pudessem fazer tudo. Demos uma parte da regulação das instituições de ensino e não toda.”
Entre as atribuições da pasta para 2021 estão: credenciamento e renovação de instituições de ensino para a oferta de Educação Básica, Especial e de Jovens e Adultos (Redes Pública e Particular), para os anos iniciais.
Já autorizações para a oferta dos anos finais e para todo o Ensino Médio continuam precisando da aprovação do Conselho Estadual, que também irá deliberar, entre outros temas, sobre Educação Profissional Técnica, cursos de formação de docentes e da EAD, dos experimentos pedagógicos, dos programas, das descentralizações e das especializações técnicas de Nível Médio do Sistema Estadual de Ensino.
Atritos
Os pontos de desentendimento entre os conselheiros e a Secretaria Estadual de Educação (Seed) apareceram no decorrer da gestão de Feder. Entre eles, o fechamento de escolas rurais, indígenas e de quilombolas.
“Não é bem assim pra fechar uma escola, tem que reunir a comunidade escolar para explicar o motivo do fechamento, dando condições que esses alunos continuem em outra escola, seguros para continuar seus estudos, inclusive pensando no transporte escolar deles”, aponta. “Não é assim: vou lá fecho a escola e largo os alunos sem estudar. A Constituição dá a eles este direito. Então tivemos muito embate com relação a escolas, principalmente do campo.”
Outro ponto de divergência polêmico foi a Educação de Jovens e Adultos (EJA). “Aprovamos o parecer 231/20, o qual assegurava que todos os alunos da EJA pudessem dar continuidade e tivessem segurança nos estudos. Pois sabemos que quem procura a EJA são pessoas que não tiveram a oportunidade de estudar na época certa, é uma Educação diferenciada que temos que atender. Temos alunos jovens e de mais de 60 anos, trabalhadores, e temos que atender.”
O embate, segundo Graça, foi que “ao longo da caminhada, eles mudam os critérios”. “Mudaram o parecer do Conselho sem pedir autorização, e o Conselho é o órgão máximo de normatização do Estado, então, tudo que será implantado de novo tem que passar pelo Conselho para análise, para ver se está atendendo aos alunos.”
“Tivemos alguns problemas assim, às vezes a Seed quer atender prontamente estes alunos e acaba fazendo instrução normativa que conflita com o que nós fizemos. Depois que dá todo esse problema nos municípios, daí mandam pro Conselho e nós temos que trabalhar pra acertar estas situações”, observa a conselheira.
A avaliação sobre a nova Matriz Curricular do Ensino Médio também divergente com a da Seed. “Para este ano, mudaram a Matriz e os professores de Artes, Filosofia, Sociologia, todos perderam aulas; de duas aulas semanais caiu pra uma. Fizeram isso e não reuniram os professores e as pessoas interessadas para poder fazer a nova Matriz. Ano que vem já vai haver uma mudança grande no Ensino Médio e na Matriz Curricular, então por que mexer este ano se ano que vem já vai ter que mexer?”, questiona Graça.
A conselheira afirma que a instrução normativa número 11, que muda disciplinas e altera carga horária, foi feita sem a aprovação do Pleno. “Nós não tínhamos conhecimento. Vamos ter conhecimento quando a bomba estoura lá na escola, que aí começam a ligar e fazer denúncias, o Ministério Público em cima querendo saber e nós não sabíamos de nada.”
E o outro?
Ela conta que, apesar de exercer um cargo de confiança do Governo, acredita que não se pode atender só de um lado. “E o outro? Precisamos trabalhar harmoniosamente. Esse era meu objetivo no Conselho, então fiquei muito surpresa de tudo o que aconteceu e até o momento estou me questionando por quê?”
A educadora recorda que no dia da transmissão do cargo de presidente – que será ocupado por João Carlos Gomes – todos os conselheiros se manifestaram favoráveis ao seu trabalho “Meu trabalho foi honesto, legal, sou uma pessoa de confiança, tenho credibilidade, todos me respeitam. Sempre trabalhei em prol da Educação. Só estou trabalhando correto, e por que me tirarem?”, volta a questionar.
“Mas eles têm esse poder, ficamos até a hora que eles querem. Deu pra mostrar meu trabalho. Sempre atendi a todos os prefeitos, deputados, secretários, MP, atendia todos, independente de sigla partidária, pois cada um deles representa a população, e se o povo elegeu estas pessoas eu tenho que atender, ouvir e ouvia a todos com muito carinho e respeito.”
Graça ressalta que foi pega de surpresa pela substituição, publicada no mesmo dia 17/3. “Não foi algo natural, foi muito desagradável a forma como aconteceu. Mas chega num ponto que você já nem quer mais saber, você sabe que não tem motivo, sabe mais os menos, mas não tem certeza.”
A professora
“Eu, como a guardiã da norma do conselho, quando a pessoa quer fazer uma coisa que não dá com a legalidade, a obrigação nossa é chamar e falar que não está dando certo. Eu, como presidente do Conselho e os conselheiros, que são todos cargos de confiança dos órgãos que representam, temos que trabalhar dentro da maior legalidade e transparência possível para estas pessoas confiarem em nós”, avalia a professora.
“Já imaginou se eu faço vista grossa e depois o Ministério Público chama atenção e manda algo para o Governo que passou pelo Conselho e eu falei sim, que estava certo? Não! Tudo o que fazemos no Conselho é para resguardar, o secretário, o governador e todas as instituições de ensino, porque se não fazemos a coisa certa as escolas não têm autonomia nem autoridade, e os alunos ficam desamparados legalmente em sua vida estudantil, então temos que ter muita responsabilidade”, conclui.
Graça Saad é professora aposentada, atuou na Educação Fundamental e Ensino Médio, na supervisão de ensino e administrativo escolar, foi diretora por 15 anos e chefe do Núcleo Regional de Educação de Jacarezinho (PR) por outros 5. Indicada pela Assembleia Legislativa do Paraná para o cargo de presidente do Conselho Estadual de Educação, agora volta para o cargo de conselheira, onde continua atuando até fevereiro de 2022.
Fonte: Plural Curitiba (https://bit.ly/3rkPWlS)