Instituições acadêmicas e sindicais, redes de educação e de defesa dos direitos humanos, grupos religiosos e comunitários, num total de 356 entidades, estão mobilizados(as) para combater a ofensiva do Governo Bolsonaro que visa regulamentar a educação domiciliar (homeschooling) no País. A APP-Sindicato participa dessa luta, juntamente com a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE) e o Fórum Estadual Popular de Educação do Paraná. A regulamentação da educação domiciliar é um ataque ao direito à educação e vai aprofundar as desigualdades sociais e educacionais existentes no País.
As 356 entidades assinam o “Manifesto contra a Regulamentação da Educação Domiciliar e em Defesa do Investimento nas Escolas Públicas”. O documento defende que a educação escolar regular necessita de mais investimentos para superar os desafios históricos e os impostos pela pandemia de Covid 19, e não da regulamentação de uma modalidade que ataca as finalidades da educação previstas no artigo 205 da Constituição Federal. Autorizar o ensino domiciliar ampliaria a desobrigação do Estado com a garantia do direito humano à educação de qualidade para todos(as).
“Mesmo fora de um contexto de exceção e emergência, a regulamentação do ensino domiciliar não se mostraria solução viável para superar os problemas enfrentados pela educação”, registra o Manifesto. A prioridade deve ser a educação integral, como acontece em países mais desenvolvidos em termos educacionais. “As metas do Plano Nacional de Educação (e dos planos subnacionais) precisam ser cumpridas; o financiamento público requer mais aportes, inclusive com a vinculação dos recursos do Pré-sal para a educação. O Sistema Nacional de Educação carece de regulamentação para potencializar os regimes de cooperação e colaboração interfederativos”, afirma.
O Manifesto aponta para a ameaça do Projeto de Lei 3.262/2019, que descriminaliza a ausência de matrícula escolar de crianças e adolescentes de 4 a 17 anos para famílias que adotarem a educação domiciliar. O Projeto está pronto para ser votado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados e encaminhado ao Plenário da Casa. Atualmente, a Lei Penal, em sintonia com preceitos constitucionais, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação e com o Estatuto da Criança e do Adolescente, prevê o crime de abandono intelectual de pais e mães que não mandarem seus filhos para a escola. Esse direito das crianças e adolescentes será eliminado se esse projeto de lei for aprovado. Outra ameaça legislativa é a proposta de substitutivo ao PL 3.179/2012, que reforça em vários aspectos o PL 2.401/2019, apresentado pelo governo Bolsonaro ao Parlamento.
A vacinação dos profissionais da educação é prioridade para o retorno das aulas presenciais, diz o Manifesto. “Porém não basta vacina, é preciso assegurar, em todas as escolas, EPIs e demais condições de segurança sanitária previstas em protocolos que priorizem a ampla testagem, o rastreamento e o isolamento dos infectados pelo coronavírus”, recomenda o texto.
As entidades reunidas no Manifesto avaliam que as secretarias estaduais, distrital e municipais estão desamparadas financeiramente para planejar e implementar o ensino remoto com novas tecnologias, o retorno às aulas presenciais, o enfrentamento da evasão escolar e o combate à violência doméstica ocorrido durante a pandemia. A inviabilização do Plano Nacional de Educação por uma política econômica de austeridade fiscal denuncia a opção do Governo Federal por tentar desviar a atenção do que deveria ser prioritário para superar a pandemia. O debate sobre o homeschooling se apresenta como mais uma agenda inoportuna diante das dificuldades vividas pelos sistemas de ensino e pela sociedade em geral.
A educação domiciliar não pode ser encarada como economia para os cofres públicos. As escolas, os conselhos tutelares e o Estado terão gastos extras com a fiscalização e adequação de suas estruturas e funcionários para acompanhar as matrículas e as atividades não presenciais previstas na proposta de regulamentação da educação domiciliar. Isto sem falar no acompanhamento das crianças em seus domicílios. “Trata-se de situações não mensuradas nos projetos em debate no Congresso e sequer passíveis de solução dentro da constitucionalidade, do quadro de direitos humanos e nas normativas da educação, que certamente demandarão novas despesas nos orçamentos públicos e das escolas particulares”, afirma o Manifesto.