Dia de Estudo e Planejamento nas Escolas

Dia de Estudo e Planejamento nas Escolas

A Seed Intensifica a sua política pedagógica de obtenção de índices e resultados padronizados, desconsiderando e desrespeitando a história da educação do Paraná

Foto: Pixabay

A Seed realiza nesta quinta (25/7) e sexta (26/7) os dias de estudo e planejamento para o segundo semestre letivo de 2019. Propõe como debate, no primeiro dia, retomar o planejamento do inicio do ano olhando para os resultados da Prova Paraná e para as taxas de abandono. Neste primeiro dia a discussão é conjunta, envolvendo Professores(as) e Agentes Educacionais. Ressaltamos a importância da participação dos(as) Agentes neste dia já que as discussões e reflexões dizem respeito as questões educacionais de uma forma em geral e que, sem dúvida nenhuma, atravessam o trabalho dos(as) funcionários(as) de escola.

No segundo dia, os (as) Professores(as) discutirão sobre as 10 competências estabelecidas na BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e organização do planejamento das aulas centrada nos resultados da Prova Paraná. Já os(as) Agentes Educacionais, a partir de algumas situações práticas, refletirão sobre as redes sociais, a violência, o bullying, o preconceito e discriminação e sobre a segurança no trabalho. É importante destacar que a temática que será debatida com os(as) Agentes é também de interesse dos(as) professores(as). Ao fragmentar a discussão desta forma, a Seed reforça o caráter divisionista, de que há conteúdos curriculares-pedagógicos que competem ao(à) professor(a) e existem questões de ordem prática e do cotidiano escolar que competem aos(às) agentes educacionais, colaborando, assim, com a manutenção da divisão social do trabalho: há aqueles(as) que pensam e aqueles(as) que fazem.

O roteiro indicado obedece à lógica instaurada na Seed, de mercantilização da educação e de centralidade na pedagogia de resultados. Tudo ao gosto dos reformadores(as) educacionais com base nos que os teóricos classificam como NGP (Nova Gestão Pública). A NGP surge na década de 1980, numa relação estreita com o neoliberalismo e de ruptura dos modelos tradicionais de gerenciamento, considerado por estes teóricos como extremamente burocrático e pesado.Tem forte influência dos thinks tanks liberais e conservadores como a Escola de Chicago e seu análogo brasileiro, a Fundação Getúlio Vargas. No Brasil essa tendência na administração pública inicia com o governo de Fernando Henrique Cardoso e é retomado com substância nos governos Temer e agora no governo Bolsonaro. Governadores como Ratinho Junior escoram-se nessa tendência para reforçar um discurso enganoso de “modernizar” a máquina pública, quando na verdade quer reduzi-lo a quase nada. Prevalece o discurso do gerencialismo, do profissionalismo, de instauração de uma cultura empresarial e do planejamento estratégico apenas na obtenção de resultados na esfera pública. No campo educacional, pressionam-se os sistemas escolares para a obtenção de melhores resultados nas provas estandartizadas e aumento nos indicadores de fluxo escolar, como retenção e abandono. Uma prática de responsabilização e mérito surge com base nos resultados obtidos nas escolas e pelos(as) docentes. O secretário e o superintendente pedagógico da educação são adeptos desta política e têm se empenhado em colocá-la em prática na educação do Paraná.

Obedecendo ao nexo instaurando, a estratégia de elevação da qualidade da educação é centrada na qualidade total, de estabelecimento e cumprimento de metas quantitativas. Daí a importância de que o planejamento contenha indicadores mensuráveis, como a tabela de proficiência que foi disponibilizada como referência para aferição das aprendizagens. Alias, saltam aos olhos a concepção tacanha que a Seed estabelece sobre o que é aprendizagem, igualando-a a proficiência, que pode ser obtida através da imitação, insight, condicionamento e raciocínio e que se efetiva através de treino e na resolução de problemas. Esqueça os teóricos da psicologia da aprendizagem como Piaget, Vigotski e Wallon, muito menos teóricos da pedagogia como Montessori, Freinet, Charlot, Ferreiro, Freire, Saviani entre outros(as). Para a Seed aprender é atingir a métrica estabelecida nas tábuas de proficiência internacionais.

O Objetivo de todo esse processo está em aumentar o Ideb. Uma das questões debatidas desde a instalação do Indice de Desenvolvimento da Educação é que ele gera um sistema de responsabilização coletiva e que na ponta atinge diretamente o professor(a) e o(a) estudante, ambos imbricados no processo de esino-aprendizagem. No material disponibilizados pela Seed para o Estudo e Planejamento essa responsabilização é evocada a cada momento. Dissocia-se do processo questões históricas, culturais e estruturais, sendo que muitas destas questões são obrigações da Seed. Em outros momentos alertamos sobre estas situações, aliás, o recém processo de greve foi uma manifestação do descontentamento da categoria para com as políticas da Seed, de manutenção de uma jornada de trabalho que não respeita os 33% de hora-atividade para professores(as) previstos em lei, na lógica gerencialista de manutenção da hora-relógio para as pedagogas(as) e professores(as) readaptados(as), da não oferta de PDE, de ausência de recomposição salarial, das perseguições e punições, do aumento do nível de adoecimento e da falta de uma política adequada, preventiva e humana de saúde para servidor(a) público, da precarização dos contratados(as) pelo PSS, do fechamento de turmas, do descaso com as modalidade de ensino como a Educação do Campo, EJA, Educação Especial e Educação Profissional e, sem contar, da exiguidade das condições estruturais para um adequado trabalho pedagógico.

Prova Paraná. Temos denunciado a instauração de um processo obsessivo de adequação das aprendizagens à dinâmica de estandardização da educação. A Prova Paraná é evidência mais sintomática desta política. A ela juntam-se os programas Tutoria e o Presente nas Escolas que participam da mesma gênese de busca pela melhoria dos resultados no Ideb. E já se desenham os próximos programas que obedecem a essa mesma gênese que são o Mais Aprendizagem e o Aluno Monitor, ambos em discussão no Conselho Estadual de Educação do Paraná.

Em determinado momento do material do Dia de Estudo e Planejamento é apresentada de forma muito evidente o caminho para se atingir o que propõe a Seed com estes programas: redução da reprovação que se dá através do controle do registro de faltas e pela ausência de aprendizagem, redução do abandono escolar, melhoria na leitura, escrita e resolução de problemas (com ênfase na operação de cálculos matemáticos). Qualquer relação com a forma como é calculado o Ideb em que leva em conta a nota na Prova Brasil e as taxas de abandono e reprovação, não é mera coincidência, é proposital.

BNCC. A Base Nacional Comum Curricular foi aprovada no período do governo Temer e obedece aos princípios neoliberais da educação. Sua implementação rompe com uma política educacional que vinha há anos consagrando o respeito às Diretrizes Curriculares Nacional e Estaduais. Trata-se de uma adequação ao modelo internacional de reforma educacional oriundo de agências financiadoras como o Banco Mundial e BID, cujo gerenciamento e formulação destas políticas estão na OCDE. E é da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico a implantação do PISA e do estabelecimento de uma régua internacional de proficiência nas línguas maternas e em matemática, que foram devidamente adequadas aos países participantes do PISA. O Brasil é um destes paises e adota a mesma métrica de proficiência estabelecida pela OCDE na Prova Brasil. O Paraná segue a reboque com a Prova Paraná. A volta das Competências e Habilidades como norteadora do currículo é mais um elemento do imbricado sistema desenvolvido pelos reformadores internacionais da OCDE, de adequação das políticas educacionais à ordem do capital.

Aqui no Estado a discussão sobre as BNCC e Referencial Curricular foi um processo confuso, de desrespeito às Diretrizes Estaduais cujos princípios epistemológicos, pedagógicos e metodológicos passam longe do que os reformadores propõem. Não obstante a isso, a discussão apresentada no Dia de Estudo e Planejamento desconsidera a Deliberação 03/2018 do Conselho Estadual de Educação do Paraná em que o Ensino Fundamental deve ter como base em sua organização curricular os direitos e objetivos de aprendizagens, muito distante das Competências e Habilidades propostas na BNCC. Também se desconsidera a Deliberação 02/2018 que estabelece um calendário para as adequação dos PPPs – a se encerrar no final deste ano letivo – e dos Regimentos Escolares, cujo o prazo vai até 2020. A ausência de qualquer discussão sobre estes prazos e para a transição e implementação da Proposta Pedagógica Curricular ao Referencial Curricular do Paraná – até o inicio do ano letivo 2020 –, desde já gera uma situação preocupante, inclusive de responsabilização dos(as) profissionais e demonstra o descaso da Seed com as questões de fundo da nossa educação.

Agentes Educacionais. Para os(as) agentes educacionais, são propostas atividades no segundo dia de análise de situações do dia a dia escolar, como divulgar fake news, briga entre estudantes, bullying com um estudante, ausência de cuidados com a segurança no local de trabalho e casos de abandono escolar. As situações propostas não estabelecem quaisquer conexões entre si ou de causalidade. São apresentadas de forma naturalizada dissociadas de contextos que as originaram. As ausências destas conexões prejudicam a análise e as respostas que devem ser produzidas. Por exemplo, a indicar uma situação de briga (violência) entre estudantes sem uma causalidade, naturaliza e descaracteriza-se esse fenômeno como um produto social e historicamente construído, culpabilizando individualmente os sujeitos envolvidos na situação apresentada, bem como, busca responsabilizar os(as) funcionários(as) pela resolução de situação nada triviais. A violência não é produto da cultura escolar, é um fenômeno complexo que precisa ser analisado em sua complexidade.

Novamente a Seed atuando na responsabilização dos sujeitos envolvidos e desconsiderando fatores históricos, culturais e estruturais da sociedade, da educação e da própria escola.

E mais uma vez a Seed orienta que a unidade escolar mantenha-se aberta, com uma escala de funcionários(as) para o atendimento à comunidade, prejudicando a participação deste segmento nos momentos de formação. A Seed insiste nessa prática e que revela um tratamento, no mínimo, desrespeitoso com estes(as) profissionais. Indicamos que as escolas façam um cartaz orientando sobre a atividade de estudo e planejamento destes dois dias e que não haverá atendimento à comunidade escolar, possibilitando, assim a participação de todos(as), sem exceção ou exclusão.

Contrapondo-se ao projeto: o caminho da Gestão de Democrática e Autonomia da Escolar. A Seed parece desconhecer os princípios da gestão democrática que estão na Constituição de 1988 e que foram retomados na LDB de 1996. Por esse princípio guiam-se as ações da gestão escolar e do próprio sistema de ensino. Trata-se de um processo participativo que respeita às instâncias escolares na discussão, definição e elaboração das próprias propostas pedagógicas de cada escola e cuja expressão máxima é o PPP. O que a Seed faz é impor um caminho de reflexão escolar para os fins que lhe interessa, com ausência de debate com os(as) trabalhadores(as) da educação e as comunidades escolares.

A atual equipe que está à frente da Seed, começando pelo atual secretário e o superintendente, desconhece a história da educação paranaense e anuncia-se como inovadora ao lançar programas e mais programas que chegam às escolas sem o mínimo de cuidado teórico, pedagógico e muito menos dialogam com a realidade e o funcionamento do sistema de ensino da rede pública estadual. Desconhecem, inclusive os trâmites necessários junto ao Conselho Estadual do Paraná, órgão consultivo e deliberativo das questões que envolvem o sistema educacional como um todo no Estado.

Mas os(as) atuais reformadores(as) não estão preocupados com a tradição pedagógica, muito em respeitar processos sociais e históricos. A preocupação deles(as) é com a adequação das propostas pedagógicas a atual ordem do capital. E nisso se juntam as fundações privatistas como a Lemann e a Itaú-Unibando, usam de ONGs como a Vetor Brasil e Todos pela Educação para avançar em seu projeto mercantilizante. São como maquinistas de tratores que devastam a floresta para dar lugar a pastagens de gado. E não se trata apenas de privatizar a educação tornando as escolas públicas em privadas, mas, e principalmente, de incorporar ideologicamente na educação o ethos mercantilizante da meritocracia, do individualismo e de ruptura do sujeito como ser social, consitiuindo-o em individuo/cliente.

No debate do dia 25 e 26 é importante que os(as) professores e funcionários(as) subvertam as reflexões tomando como base para as discussões à luz da gestão democrática e autonomia das escolas, rompendo com o estabelecido pela da Nova Gestão Pública de base na pedagogia de resultados, no estabelecimento de metas, na comparação com indicadores padronizados e num sistema de responsabilização e meritocrático.

Para isso indicamos e insistimos na leitura e discussão do Manifesto por uma Educação Humanizadora (https://appsindicato.org.br/manifesto-por-uma-educacao-humanizadora-contra-a-mercantilizacao-da-escola-publica/) até como forma de combater a terra arrasada que acontece na educação paranaense e que é expresso nos programas que estão sendo desenvolvidos pelos(as) atuais reformadores(as) educacionais que operam na Seed. Não são poucos estes programas, e pelo que se sabe virão outros. No entanto, encontrarão resistência e enfrentamento de nossa parte, o sindicato, como de resto da categoria de professores(as) e funcionários(as) de escola como vimos fazendo ao longo deste semestre e em anos anteriores.

Por último, manifestamos nosso desejo de um bom retorno após a grandeza de nossa greve que teve a importância pedagógica de explicitar ainda mais para a categoria o projeto de desmonte educacional em curso, e por sua vez, romper com o ciclo de medo imposto pelas punições dos últimos períodos. Por isso não baixaremos a guarda e continuaremos sendo resistência no interior das escolas, sempre como horizonte uma educação pública gratuita, laica, socialmente responsável e de qualidade, para emancipação dos sujeitos e não à sua sujeição acrítica a ordem liberal.

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