O governo federal publicou no Diário Oficial da União desta sexta-feira (21) o decreto que revoga definitivamente o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares. Apesar de não ter efeito direto sobre o programa do Paraná, a APP avalia que a decisão fortalece a luta que o Sindicato faz contra as irregularidades do modelo imposto no estado.
“Esse decreto não acaba com a lei aprovada no Paraná, mas é um passo importante para a nulidade dessas leis em cada estado”, afirma Marlei Fernandes, secretária de Assuntos Jurídicos da APP.
Outra novidade indica que há espaço para avançar no estado. Em manifestação nesta quinta-feira (20), o Ministério Público do Paraná concordou com a tese da APP sobre a irregularidade das consultas promovidas pelo governo Ratinho Junior em 2020 para militarizar as escolas estaduais. As consultas às comunidades escolares foram realizadas na semana seguinte à aprovação da Resolução 4186/2020, que estabeleceu os critérios para o processo.
Segundo a manifestação, assinada pela promotora Laís Letchacovski, a proximidade entre a divulgação e a realização das consultas “macula (…) a idoneidade do processo, uma vez que aparenta privar a submissão da questão a debate público perante a comunidade escolar.” À época, a APP denunciou diversas irregularidades, como a falta de contraponto nas consultas e de direito ao voto secreto para aprovar ou rejeitar o modelo.
Já em 2020 o Ministério Público Estadual recomendou que a consulta não ocorresse, mas o governo do Paraná ignorou a petição.
Além de desviar recursos da educação para as forças armadas e violar a LDB, não há qualquer evidências de que escolas cívico-militares se saem melhor do que escolas públicas tradicionais.
Escola é para aprender e ensinar, não para sustentar militar. pic.twitter.com/UlfNhPyDt8
— APP Sindicato (@appsindicato) July 14, 2023
Revogação do programa nacional
O decreto nº 11.611/23 é assinado pelo vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, e pelo ministro da Educação, Camilo Santana. O documento determina que, em até 30 dias, seja pactuado um plano de transição com estados, distrito federal e municípios responsáveis pelas escolas vinculadas ao programa.
Na quarta-feira (12) da semana passada, o MEC já havia encaminhado um ofício a secretários(as) estaduais da Educação comunicando a decisão. De acordo com o ofício, o término do ano letivo deve ser conduzido dentro da normalidade e com o planejamento de estratégias específicas para reintegração das escolas à rede regular de ensino.
No Paraná, das cerca de 200 escolas militarizadas, apenas 12 são vinculadas ao programa nacional. Na contramão do governo federal, a gestão Ratinho Jr. anunciou que vai incorporar esses estabelecimentos ao programa estadual de colégios cívico-militares.
Não é função das forças armadas cuidar de educação básica.
Não é função da escola servir de cabide de emprego para militares. Ponto. @octavio_guedes resume o ridículo da situação. pic.twitter.com/JSd5yzfoVW
— APP Sindicato (@appsindicato) July 14, 2023
Ilegal
Além da reprovação por especialistas em educação, o modelo implantado em 2019, na gestão Bolsonaro, não possui respaldo na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Durante audiência na Câmara dos Deputados, realizada em abril deste ano, o ministro da Educação respondeu a vários questionamentos sobre o tema e também rebateu afirmações falsas de que as escolas militarizadas apresentariam melhor desempenho do que as instituições cívicas.
“Esse programa foi criado por decreto, não foi por lei. Foi uma decisão unilateral do Ministério da Educação à época, pois na Lei de Diretrizes e Bases e no Plano Nacional da Educação não há nenhuma menção ou estratégia de incluir as Forças Armadas na educação básica desse país”, disse.
Santana citou uma pesquisa divulgada pelo instituto Datafolha em que 72% dos(as) brasileiros(as) afirmam que confiam mais nos professores do que em militares para trabalharem nas escolas. O ministro também afirmou que das 100 melhores escolas públicas do Brasil, nenhuma é militar.
Luta continua
Marcado por casos de abuso de autoridade contra estudantes, as escolas militarizadas também promovem a desvalorização dos(as) trabalhadores(as) da educação. Recursos que deveriam ser investidos na infraestrutura das escolas e na melhoria das condições de salário e trabalho dos(as) professores(as) e funcionários(as) são desviados dessa finalidade para engordar a remuneração de policiais aposentados(as).
Antes de iniciar o recesso do mês de julho, por exemplo, a Assembleia Legislativa do Paraná aprovou o projeto de lei nº 556/2023, enviado pelo governador Ratinho Jr., aumentando em em 57% o valor gasto com a gratificação paga a militares inativos(as) que atuam na monitoria e direção dos colégios cívico-militares do Paraná.
O valor passará de R$ 3,5 mil para R$ 5,5 mil, quantia cinco vezes maior que o salário básico dos funcionários(as) de escola (Agente Educacional I). O impacto financeiro da benesse a militares é estimado em cerca de R$ 34 milhões em 2023.
A decisão representou como um deboche para os(as) trabalhadores(as) da educação pública. Dias antes dessa votação, os(as) deputados(as) aprovaram recomposição de 13,25% para professores(as) e irrisórios 5,79% para agentes educacionais, que já recebem os piores salários do funcionalismo estadual.
O total anual que será gasto para beneficiar os(as) policiais aposentados(as) é superior ao que custaria para incluir os(as) professores(as) aposentados(as) sem paridade no reajuste do piso nacional do magistério. Ratinho negou o reajuste de 13,25% a esse grupo, concedendo apenas 5,79% de reposição.