A Seed propõe para os dois dias de planejamento reflexões que giram em torno do clima escolar e da gestão de sala de aula. Como tem sido comum, utiliza-se de conjunto de teorias, algumas interessantes e inovadoras, para justificar a sua pedagogia de resultados.
De imediato percebemos que os temas que são propostos obedecem a uma lógica que inicia com o clima escolar, passa pela gestão de sala de aula, salta para a observação das aulas, o uso das plataformas e metodologias ativas e termina com o planejamento propriamente dito, sem, no entanto, antes, refletir sobre os indicadores de cada escola. Busca-se com tudo isso obter maior rendimento e diminuir a evasão escolar.
Evidente que as políticas educacionais precisam combater a evasão, principalmente no Ensino Médio, cujas pesquisas indicam ser maiores que a evasão observada no Ensino Fundamental – anos finais, e aumentar as taxas de aprovação, que se dá pela elevação da aprendizagem dos(as) estudantes. Temos denunciado que, apesar dos fins serem legítimos – elevação da aprovação e baixa taxa de evasão -, a política educacional da Seed está direcionada, e os meios indicam isso, para uma política de resultados, de obtenção de índices que permitam o crescimento no IDEB.
Essa contradição entre meios e fins é perceptível no primeiro dia de debates, quando a proposta de debates é sobre a importância do clima escolar para a produção de aprendizagens. No entanto, ao desenvolver o tema, escondem-se propositalmente pontos relevantes para estes debates, que autores como Santos e Adam (2022), Gomes (2005) e Vasconcellos (1994) apresentam.
O tema clima escolar emerge na educação a partir das reflexões sobre a importância do clima organizacional para a produção de resultados nas empresas, portanto, desde sua gênese, há um caráter empresarial na reflexão do tema. Autores críticos, ao ressignificá-lo na educação, apresentam contextos que procuram contemplar a complexidade que é a escola e que de longe lembra uma empresa.
Evidentemente um clima escolar harmonioso, uma convivência respeitosa, saudável e solidária, em que há o envolvimento e sentimento de pertencimento de toda a comunidade escolar, motiva a produção do ensino-aprendizagem e inspira-expira um sentimento de bem-estar, contribuem significativamente para melhoria das aprendizagens.
No entanto, a Seed, de acordo com seus interesses e que não são outros que não a produção dos resultados que impactam no IDEB, tal qual uma empresa ao estabelecer metas a serem cumpridas, elege alguns elementos tratados por autores críticos quando discutem o tema do clima escolar (como percepção do ambiente escolar, relações interpessoais, envolvimento de pais, mães e responsável e o estabelecimento de normas e regras), e deixa de fora outros elementos que são igualmente importantes nesse processo. Por exemplo, Santos e Adam (2022, p.14) fazem o debate a partir dos contextos da gestão democrática escolar, cujas relações de poder, autonomia escolar, processos de controle externo e até mesmo o impacto das avaliações externas, precisam e devem ser refletidas no interior da escola, bem como as condições de trabalho precisam ser levadas em conta, e que não aparecem no debate que Seed apresenta, ao contrário, para a Secretaria a escola está isolada destes e outros contextos.
A insuficiência proposital destas reflexões compromete o debate e remete o problema do clima escolar exclusivamente à escola e deixa de fora a influência das políticas externas promovidas pela Secretaria, que como todos(as) sabemos, tem produzido a sobrecarga, o adoecimento, a falta de autonomia e a negação da gestão democrática no ambiente escolar.
Na sequência dos temas dos dias de planejamento, encadeiam-se temas como a gestão de sala de aula, compreendido como a organização dos tempos e espaços escolares para a produção de aprendizagem, e novamente observa-se a ausência da influência das políticas educacionais da Seed nesta gestão de sala de aula, remetendo exclusivamente ao(à) professor(a) esta gestão, sem, no entanto, que lhes dê condições para isso, ao contrário, as atuais políticas da Seed é de asfixia da autonomia pedagógica com o uso constante de plataformas, os(as) tutores(as), os(as) embaixadores e a observação de sala de aula.
O controle do processo de ensino que envolve a sala de aula e, portanto, compromete a gestão desse espaço, evidencia-se quando, no segundo dia, a Seed propõe como debate a observação de sala de aula, a utilização das metodologias ativas e o uso das plataformas. Sobre estes temas marcamos, em outros momentos, nossa total contrariedade, seja porque não dialoga com a complexidade e diversidade que representa cada escola, fere a gestão democrática, a autonomia do(a) professor(a) e impacta na saúde destes(as) profissionais, ou ainda, porque atendem a uma lógica empresarial da busca de índices para o IDEB.
Assim, os dois dias de planejamento evidenciam um ciclo que destaca o clima escolar, a gestão de sala de aula, cuja observação cumpre o papel de controle e coerção sobre a ação do professor(as), e o uso das metodologias ativas e das plataformas. Todo esse ciclo está organizado para a obtenção de baixos índices de evasão, cuja mensuração é planilhada em um BI de cada escola, e para a produção de alto rendimento escolar, que pode ser mensurado a partir da Prova Paraná e outras avaliações de larga escala nacionais e internacionais. No final do ciclo, espera-se, como resultado, a obtenção de um índice do IDEB superior ao anterior em cada escola.
Os(a) funcionários e os dias de planejamento
É importante ressaltar a participação dos(as) funcionários(as) em momentos comuns aos(às) professores(as). Esta tem sido uma reivindicação constante nossa que atende a perspectiva de uma escola que olha para o conjunto de seus trabalhadores(as), sejam eles professores(as) ou funcionários(as), como educadores e, portanto, produtores de aprendizagem.
Esta participação se dá no primeiro dia, quando do debate sobre o clima escolar, e no segundo dia, quando se discutem os resultados da Prova Paraná para cada escola e proposição de prática pedagógica. Nestes dois temas valem as críticas feitas anteriormente, principalmente as que se relacionam à ausência no debate da gestão democrática e à ação da Seed e suas políticas para a produção da sobrecarga e adoecimento escolares.
Não há como se ausentar deste debate, a atual política de terceirizações não contribui para um clima escolar que se espera seja mais harmonioso, solidário e respeitoso. Isso nada se deve aos(as) profissionais terceirizados(as), mas a política em si, uma vez que revela uma condição de precarização (baixo salários e sobrecarga de trabalho) e uma alta rotatividade destes(as) profissionais(as) nas escolas e que não produz vínculos efetivos, que são importantes componentes para a obtenção de um clima escolar respeitoso e solidário.
Por outra escola possível: democrática e humana
O título anterior poderia ser um bom tema para discussão nos dias de planejamento. Ele contém uma perspectiva que evidencia, de um lado, a negação de um projeto de escola que tem adoecido seus profissionais; por outro, anuncia a possibilidade de uma escola democrática e humana. Se a proposta é refletir sobre o clima escolar, deveríamos fazê-lo sobre estes dois horizontes e a partir da complexidade que envolve a escola, seu entorno e as políticas educacionais de uma forma geral.
Temos insistido numa escola humana e humanizadora, que se revela nas relações de acolhida, afeto e solidariedade entre todos(as), além, obviamente, dos cuidados com a aprendizagem e com a efetiva valorização profissional. Uma escola cujas relações se pautam pela gestão democrática que pressupõe, basicamente, a participação efetiva de todos(as) numa relação de poder que constrói na horizontalidade, num clima de confiança e pertencimento.
Como diz a música de Chico Buarque: apesar de você, amanhã haverá de ser outro dia, o jardim florescer e esbanjar a poesia. Que 2024 esperancemos e, apesar das políticas educacionais deste governo, contra ela toda a nossa justa raiva, façamos florescer outro dia em que veremos esbanjar a poesia.
Secretaria Educacional da APP-Sindicato
Referências:
GOMES, C. A. A escola de qualidade para todos: abrindo as camadas da cebola. IN: Avaliação e políticas públicas em educação, 13. Rio de Janeiro: Cesgranrio, 2005.
SANTOS, J. M. V e ADAM, J. M. Clima escolar. Perspectivas e possibilidades de análise. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2022.
VASCONCELLOS, C. S. Disciplina: construção da disciplina consciente e interativa em sala de aula e na escola. São Paulo: Libertad, 1994.