O presidente Jair Bolsonaro vetou integralmente o Projeto de Lei (PL) 3.477/2020 que obrigava o governo federal a garantir o acesso à internet, para fins educacionais, a alunos e professores das escolas públicas. O veto total foi publicado na edição desta sexta-feira (19) do Diário Oficial da União (DOU) com aval dos ministério da Economia e da Educação.
A proposta já havia sido aprovada em fevereiro pelo Senado e previa o repasse de R$ 3,5 bilhões da União para que estados, municípios e o Distrito Federal fornecessem serviços de internet. Mas o presidente alegou que o projeto não apresentava estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro. O que, segundo Bolsonaro, “aumentaria a alta rigidez do orçamento” e “dificultaria o cumprimento” da Lei de Responsabilidade Fiscal e da chamada regra de ouro.
A informação, no entanto, constava no texto originalmente proposto, de autoria da Câmara dos Deputados. No PL foi determinado pelos parlamentares que os recursos seriam oriundos do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust). E o impacto orçamentário seria de R$ 26,6 bilhões. Já “incluso o acesso à internet à totalidade de matrículas e de docentes da educação básica pública, além da compra de equipamentos para o devido acesso”, indicava a proposta.
Sem acesso, com desigualdade
Com o veto, deixaram de ser beneficiados alunos cujas famílias estão inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico) do governo federal. Assim como estudantes matriculados nas escolas das comunidades indígenas e quilombolas e os professores da educação básica pública. O projeto de lei também previa que os recursos repassados fossem aplicados na contratação de internet móvel. Para também permitir que estudantes e docentes acompanhassem as atividades pedagógicas não presenciais.
A prerrogativa era decisiva em meio à pandemia de covid-19, no momento em que a suspensão das aulas presenciais é defendida por especialistas para conter o avanço da doença no país. Além disso, a pesquisa TIC Domicílios 2018 já mostrava que, em todo o país, 42% dos lares não possuíam computadores. Os pesquisadores também advertiam que a conectividade era bastante precária. “Muitas famílias não têm sequer televisão em casa, imagina ter uma boa internet”, observaram em reportagem da RBA publicada no ano passado.
Sem perspectivas de acesso à internet, o provável é que sejam ampliadas as desigualdades e a exclusão de grande parte dos alunos. A professora Catarina de Almeida Santos, coordenadora do Comitê no Distrito Federal da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, criticou pelas redes sociais o veto de Bolsonaro ao PL. Segundo ela, o presidente “quer é a retomada das aulas presenciais, para aumentar o número de casos e óbitos. Genocida está singelo”, tuitou Catarina.
Genocida é singelo
Parlamentares da oposição também reagiram ao veto de Bolsonaro. A deputada federal Perpétua Almeida (PCdoB-AC) destacou que 18 milhões de alunos e 1,5 milhão de professores continuarão sem acesso à internet. “Adeus aulas online na pandemia”, lamentou. O também deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) descreveu Bolsonaro como “inimigo da educação pública”, pecha utilizada pela deputada Natália Bonavides (PT-RN), que acrescentou: “com o isolamento social, muitos estudantes não estão conseguindo acompanhar as aulas online por falta de internet em casa”.
O deputado José Guimarães (PT-CE) advertiu que “o ensino está corroído pela pandemia e recebe o desprezo do presidente”. “O genocida é incapaz de assegurar o direito à educação previsto na Constituição”, completou. Mesmo parlamentares que apoiaram a eleição de Bolsonaro em 2018 contestaram o veto. Pelo Twitter, a deputada Professora Dayane Pimentel (PSL-BA) ironizou dizendo que “quando (Bolsonaro) não está atrapalhando na Saúde, está atrapalhando na Educação”.
Internautas também chamaram atenção para o que entendem ser uma “contradição” do presidente, já que, na quarta-feira (17), a seu pedido, o Congresso Nacional derrubou o veto para permitir o perdão de R$ 1,4 bilhão em dívidas de igrejas.
Segundo veto
Na justificativa do veto, o presidente relativizou a crise educacional, argumentando que o governo federal “está empregando esforços para aprimorar e ampliar programas específicos” de “contratação de serviços de acesso à internet de banda larga nas escolas públicas”. Ele também alegou que o Ministério da Educação elabora o programa Brasil de Aprendizagem para tratar do assunto.
A matéria, porém, não parece ser do agrado de Bolsonaro. Reportagem do jornal O Globo, do final do ano passado, mostra que ele já havia vetado outro projeto cujo tema central era o acesso à internet nas escolas. Com a mesma justificativa de suposta ausência de previsão do impacto orçamentário, Bolsonaro rejeitou o trecho de uma lei que previa a obrigatoriedade de internet em toda a rede pública até 2024.
Fonte: CUT (https://bit.ly/3lATEqb)