Um grupo de pesquisadores do Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica do Instituto de Economia da Unicamp analisou os dados que o governo de Jair Bolsonaro (PSL) escondeu durante meses sobre a reforma da Previdência.
A constatação é de que o Congresso Nacional recebeu informações adulteradas para que deputados e senadores aprovassem a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 06/2019, nome oficial da reforma, achando que estavam combatendo privilégios.
Pelos dados falsos apresentados pelo governo, o fim da aposentadoria por tempo de contribuição acabaria com o privilégio de trabalhadores com salários mais altos e estabilidade de emprego que hoje podem se aposentar mais cedo. Segundo os dados, eles recebem benefícios por mais tempo e, por isso, oneram o sistema público de aposentadoria de modo injusto.
De acordo com o estudo, isso é mentira. Pelas regras atuais, as aposentadorias por tempo de contribuição do Regime Geral da Previdência Social (RGPS) geral superávit e ajudam a combater a desigualdade. A afirmação é do doutor em economia Pedro Paulo Zahluth Bastos, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Cecon-Unicamp, ex-professor visitante na Universidade da Califórnia em Berkeley e coordenador da equipe responsável pelo estudo, divulgado em uma nota técnica.
O grupo é formado também pelos pesquisadores André Luiz Passos Santos, mestre em História Econômica pela USP e analista bancário aposentado, Ricardo Knudsen, doutor em Química pela USP, especialista em Design de Experimentos e proprietário da KnudZen Consulting, na Itália, e Henrique Sá Earp, professor do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica da Unicamp, mestre em Física Teórica pela University of Cambridge e ph.D em Matemática pelo Imperial College London.
As revelações inéditas foram ignoradas pelos grandes veículos de comunicação, que só publicam matérias favoráveis à reforma da Previdência. Já a revista Carta Capital deu destaque ao conteúdo. Confira aqui a matéria na íntegra.
:: Leia abaixo o resumo do trabalho dos pesquisadores.
A falsificação nas contas oficiais da Reforma da Previdência: o caso do Regime Geral de Previdência Social
Pedro Paulo Zahluth Bastos, Ricardo Knudsen, André Luiz Passos Santos e Henrique Sá Earp
Resumo:
Obtivemos a planilha com cálculos oficiais do Ministério da Economia sobre a Reforma da Previdência, até então em sigilo, através da Lei de Acesso à Informações (LAI). Auditamos e encontramos indícios de falsificação ou, no mínimo, incompetência inexplicável. Os cálculos manipulam os dados sem respeitar a legislação e inflam o custo fiscal das aposentadorias atuais para justificar a reforma e exagerar a economia fiscal e o impacto positivo (inexistente) sobre a redução da desigualdade da Nova Previdência.
• Refazendo os cálculos oficiais com o uso das normas vigentes legalmente, demonstramos que, para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o subsídio para as aposentadorias dos trabalhadores mais pobres diminui e não aumenta com a reforma da previdência. Por sua vez, as aposentadorias por tempo de contribuição (ATC) obtidas nas regras atuais com idades mais novas geram superávit para o RPGS e tem impacto positivo na redução da desigualdade. Este resultado se verifica inclusive considerando pensões por morte. Por isto, a abolição da ATC resulta em déficit para o RGPS, o que é compensado pela Nova Previdência com novos critérios de acesso (tempo de contribuição e idade) e cálculo (redução) dos benefícios que prejudicam principalmente os mais pobres, agravando a desigualdade.
• O aumento do subsídio para os mais pobres pós-reforma é falso. Como o superávit alegado pelo governo com a abolição da ATC é falso, a estimativa de economia com a reforma também é falsa. As principais manipulações dos dados são as seguintes:
• 1) o governo alega calcular a ATC, mas na verdade calcula a aposentadoria por idade mínima (AI), relatando valores que inventam um déficit das ATC que é, na verdade, das AI;
• 2) ao calcular as AI no lugar das ATC, o governo calcula a aposentadoria recebida segundo o pico do salário estimado em 2034, ao invés da média dos salários, o que infla o custo das aposentadorias para inflar o suposto déficit;
• 3) para o salário de R$ 11.770,00 usado na simulação oficial do custo de uma ATC hoje, o governo não apenas calcula uma AI, como também subestima as contribuições do empregado e, principalmente, do empregador: a) para o empregado, calcula contribuições de 11% sobre o valor de 5 SM, e não do teto do RGPS (que hoje está muito mais próximo de 6 do que 5 SM); b) para o empregador, também calcula as contribuições de 20% sobre 5 SM, e não sobre o valor total do salário (R$ 11.770,00);
• 4) para o salário mínimo, o Ministério da Economia também troca a simulação da ATC pela AI, o que subestima o subsídio atual para os trabalhadores pobres porque hoje não é preciso esperar a idade mínima de 60/65 anos (mulheres/homens) para garantir a integralidade de benefícios por tempo de contribuição;
• 5) ao calcular as AI no lugar das ATC, o governo subestima o subsídio atual para os trabalhadores pobres porque simula contribuições por 20 anos e não a condição mínima de 15 anos de contribuição, tampouco a idade média da AI nas regras atuais (19 anos); feita a correção nos dois casos, a Reforma da Previdência não apenas diminui o subsídio para os mais pobres, como joga muitas famílias na pobreza.
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Texto produzido com informações da CUT.