Esse processo antecede o decreto de declaração de interesse social da área (que autoriza as desapropriações privadas) e a desintrusão, etapas necessárias para serem percorridas até que seja possível a titulação da terra como propriedade coletiva. Agora, o Incra do Paraná deverá realizar vistorias de avaliação das áreas hoje ocupadas pela Cooperativa Agrária Agroindustrial Entre Rios, para que então possam ser ajuizadas as ações de desapropriação, com a consequente devolução do território para os quilombolas. Serão regularizados aproximadamente 1,5 mil hectares de terra.
A moradora do núcleo Assentamento (Guarapuava/PR), Ana Maria Santos da Cruz, indica a satisfação da comunidade. “A alegria é tanta que a gente nem está acreditando. São mais de 40 anos de espera para poder voltar para a nossa terra”, comemora.
O assessor jurídico da Terra de Direitos, que esteve presente no evento, considera que assinatura dessa portaria é uma grande vitória quilombola no Paraná. “Passados quase 26 anos da promulgação da Constituição Federal, que estabelece o direito dos quilombolas à terra, não há mais espaço para retardar a efetivação de direitos dessas comunidades tradicionais no Brasil”, destaca.
“Espera-se que a Presidenta da República assine o decreto que viabiliza a desapropriação do território e que se dê efetivo andamento aos processos de titulação das 37 comunidades quilombolas do Paraná”, acrescenta. É possível que o decreto de interesse social da área seja assinado ainda este ano, em 20 de novembro, data que marca o Dia da Consciência Negra.
Estiveram presentes no ato a ministra da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial do Paraná (Seppir), Luiza Barros, e o ministro interino do Desenvolvimento Agrário Laudemir André Müller. Representantes da comunidade Paiol de Telha, da organização Terra de Direitos e de outras entidades de direitos humanos, movimentos sociais e órgãos do Estado também participaram.
O caso Paiol de Telha – Cerca de 300 famílias foram expulsas de forma violenta das terras em 1970, por imigrantes alemães que fundaram no local a Cooperativa Agrária Agroindustrial Entre Rios, uma grande produtora de commodities na região. Os integrantes da comunidade quilombola habitavam o espaço desde 1860, quando 11 trabalhadores escravizados foram libertados pela proprietária da terra, Balbina Francisca de Siqueira, e receberam o território como herança.
Atualmente, os habitantes dessa comunidade tradicional estão divididos em quatro núcleos – Pinhão, Guarapuava, Assentamento e Barranco (localizado às margens da área original) –, vivendo muitas vezes em situação precária. A titulação das terras deve mudar essa realidade, e unificar a comunidade. “A vontade de retomar o território, de viver juntos novamente, é muito grande”, destaca Ana Maria. E completa. “O que está acontecendo é fruto da luta da comunidade, que contou com o apoio de muita gente”.
Um dos primeiros do estado, o processo de titulação do território foi aberto no Incra em 2005. Desde então, vinha caminhando a passos lentos. Em 2013, o caso do Paiol de Telha ganhou visibilidade com o julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região – TRF4 de uma ação movida pela Cooperativa Agrária. A ação questiona o processo administrativo para a titulação do território, sob a alegação de que o Decreto 4887/03*, seria inconstitucional.
No entanto, o julgamento dessa ação, realizado em dezembro do ano passado, considerou constitucional esse decreto que regulamenta os procedimentos de titulação de territórios habitados por remanescentes quilombolas.
Fonte: Terra de Direitos