10/04/09 – Moradores do bairro do Caximba, em Curitiba, se organizam contra o lixo, pelo direito ao território e ao meio-ambiente
‘Com o lixão, não dá para ver o céu”, faixa de um dos moradores do CaximbaSeres humanos buscam restos de comida em meio ao aterro sanitário que concentra o lixo da capital e de mais 16 cidades do Paraná. Outros comercializam os alimentos que chegam por ali com prazo de validade vencido, vendidos para os comércios da região. Urubus, mosquitos, fedor. Aborto por anencefalia, problemas renais e respiratórios, casos comuns entre os moradores do Caximba, bairro de Curitiba onde está instalado o maior aterro sanitário do Estado.
A região é habitada por trabalhadores e proprietários de quarenta olarias, fábricas de cimento e grameiras. É o pólo industrial cerâmico da capital. Descendentes de italianos vivem por lá há décadas. Mas hoje o Caximba está associado apenas com o aterro sanitário, que existe há 20 anos, embora sua vida útil fosse de apenas 11. Desde 1989, houve duas ampliações emergenciais. O prefeito Beto Richa (PSDB) sinaliza nova ampliação do aterro e a criação de uma indústria de reciclagem, o Sistema Integrado de Processamento e Aproveitamento de Resíduos (Sipar).
Os moradores são contrários à continuação do lixão e da indústria no território. Denunciam o risco de desmoronamento desse aterro lotado, o acúmulo de gases com poucos fornos para queimá-los e a concentração de compostos como o metano. O chorume (líquido que escorre a partir do lixo) desemboca no rio Iguaçu. A Prefeitura admite vazamento, mas afirma ser algo “não suficiente para alterar a poluição atual”, como disse José Antônio Andreguetto, secretário de meio-ambiente, em entrevista a uma rádio local.
De acordo com os moradores, o novo prolongamento do lixão deve desapropriar cem hectares de área, o que pode atingir cerca de 30 mil pessoas. A luta dos moradores é para que o aterro seja lacrado (veja abaixo a pauta do movimento).
A instalação do aterro é estudada para outros dois municípios da Região Metropolitana de Curitiba – Fazenda Rio Grande e Mandirituba. Segundo Adélcio Ângelo Bazzo, morador e integrante do movimento de defesa do Caximba, os estudos sobre o destino do lixão “consideram os impactos ambientais, mas não levam em conta a população local”. Durante o feriado da Páscoa, várias cruzes vão ser pregadas ao longo de toda a estrada no entorno do aterro, como forma de protesto. “Temos um passivo de vinte anos, casas há cinqüenta metros do lixão. A creche fica há 50 metros do portão do aterro, com o teto cheio de moscas”, acrescenta Ana Cristina Juzcok, moradora há oito anos do local.
Fortes interesses
Interesses econômicos em cena: a empresa licenciada para a coleta do lixo, chamada Cavo, pertence ao Grupo Camargo Corrêa, envolvido em recentes denúncias de corrupção e compra de políticos país afora. De acordo com fonte do Brasil de Fato, a Prefeitura de Curitiba tem interesse eleitoral em construir a nova indústria no Caximba. A resistência dos moradores aponta para a construção na cidade de Mandirituba, onde a Camargo Correia possui terreno, mas esbarra no momento com lei municipal que impede a instalação. Não é má jogada para ninguém: as cidades teriam direito a 3% da arrecadação do lixo.
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Em outras áreas analisadas para instalação do aterro, como a cidade de Fazenda Rio Grande, também houve denúncia de moradores. “O problema são as nascentes da região e o trânsito de caminhões”, critica o técnico em meio ambiente, Eriberto Werner.
Os moradores da região ainda não têm uma solução para o lixo. Defendem que o processo deve ser debatido, por meio de um fórum com os trabalhadores de outras cidades e bairros que possam ser afetadas. “A Prefeitura não incentiva a redução do lixo, fizemos caminhada que parou o lixão por uma hora e meia, manifestação com faixas e braços dados em frente ao lixão. Vamos nos articulando, se o projeto não foi aprovado ainda é pelo barulho das pessoas”, conclui Ana Cristina.